top of page
Foto do escritorRedação

Reciclagem x Inclusão: A disputa entre colaboração e competição fica mais acirrada com o aumento da desigualdade

Por Tobias Ferraz*


Quem andou pela cidade de Araras - SP, entre o final do ano passado e o começo deste ano pôde observar o grande volume de material reciclável depositado nas calçadas, na frente das casas. Os montes de entulho junto ao meio fio também serviam para dar um ar de falta de cuidado ou relaxo com as vias públicas.


Crédito: Tobias Ferraz

O acúmulo de entulho, sabemos, é descuido na observação das datas para “botar fora” ou até mesmo descumprimento de prazo pela equipe do “cata bagulho”.


Quanto ao material reciclável estamos vivendo uma séria crise na cadeia de processamento.


Os preços pagos pelo alumínio, garrafas pet, e papelão estão em baixa e já não atraem os catadores.


O quilo do papelão, por exemplo já foi negociado pelos catadores por R$ 1,00 o quilo, atualmente o preço pago caiu para R$ 0,25.



A tabela acima mostra a brusca queda no preço pago, um fator de desestímulo para a coleta. “Os preços estão muito baixos, que no fim do mês a gente não faz um salário”, me disse um catador autônomo.

Crédito: Tobias Ferraz

Como se não bastasse a queda dos preços, a cadeia vive um grande desequilíbrio. Muitos compradores, chamados também de “sucateiros” , compraram materiais na fase de alta e esperam os preços subirem novamente para passar adiante para as recicladoras sem ficar com o prejuízo. Com isso, muitos depósitos estão superlotados, principalmente de alumínio sem ter mais onde estocar. “Um sucateiro me disse que no Carnaval vai parar tudo, porque não tem para quem vender”, me contou uma fonte.


Crédito: Tobias Ferraz

O conceito de reciclagem, que carrega originalmente junto com ele o propósito de inclusão e geração de renda, está capenga, num claro sinal da perversidade de um sistema que tem como primeiro mandamento o lucro, o bem estar ambiental e social vêm em outros planos.


Essa constatação é reforçada pelas análises do relatório divulgado nesta semana pela organização Oxfam. O relatório aponta que a desigualdade entre ricos e as demais classes econômicas atingiu níveis alarmantes. Segundo o relatório, 63% da riqueza brasileira está nas mãos de apenas 1% da população, enquanto os 50% mais pobres detêm somente 2% do patrimônio nacional. “No ritmo atual, serão necessários 230 anos para acabar com a pobreza, mas poderemos ter o nosso primeiro trilionário em 10 anos.”, afirma um trecho do relatório. Acesse o documento completo aqui: https://www.oxfam.org.br/forum-economico-de-davos/desigualdade-s-a/


Diante da paralisação dos negócios entre catadores, cooperativas e “sucateiros”, ouvi de um representante dos coletores que seria mais adequado a população não colocar nas ruas o material reciclável até que essa crise seja resolvida.

Crédito: Tobias Ferraz

Diante dessa cruel realidade, ditada pelo mais perverso mecanismo de mercado, os catadores, elo mais fraco da corrente na escala de valores do capital, estão de mãos atadas, sem saber a quem recorrer.


O momento exige compreensão por parte da sociedade e ação do poder público, porque este não está cooperando para que o ciclo da reciclagem se mantenha circular e dessa forma contribuir com a renda dos catadores, com o meio ambiente e com a redução nos impactos da crise climática que vivemos.


“O próximo grande salto evolutivo da humanidade será a descoberta de que cooperar é melhor que competir.”

A frase é do filósofo italiano Pietro Ubaldi, ganhador do prêmio Nobel de Literatura e falecido em 1972


“Reciclar é preciso”, ou seja, é possível manter o setor funcionando de forma contínua, mas alguém não está cumprindo com a sua parte, e não são os catadores.


///


*Tobias Ferraz é jornalista, especializado em Natureza e Meio Ambiente e fundador da página @biografia_brasil no Instagram

Comments


bottom of page